A Comissão de Valores Mobiliários (CVM) iniciou um processo administrativo para investigar possíveis irregularidades na nomeação de três ministros do governo Lula para o Conselho de Administração da Tupy, uma metalúrgica multinacional cujas ações são negociadas na Bolsa de Valores. Os ministros em questão são Carlos Lupi, da Previdência; Anielle Franco, da Igualdade Racial; e Vinicius Marques de Carvalho, da Controladoria-Geral da União. A CVM acredita que eles deveriam ter buscado um parecer formal sobre a possibilidade de conflito de interesses antes de aceitar esses cargos.
A BNDES Participações (BNDESPar), que possui 28,19% das ações da Tupy, indicou os ministros para o conselho em 2023. No entanto, somente no final do ano passado, a Comissão de Ética Pública (CEP) da Presidência recebeu o caso para análise após questionamentos da CVM.
Apesar de a CEP ter emitido um parecer favorável à participação dos ministros, o processo ainda não está encerrado. No dia 24 deste mês, a comissão decidirá se abrirá um processo por violação ética, pois os ministros não consultaram a CEP antes de assumirem os cargos.
A Casa Civil informou que a CEP analisará se há necessidade de uma sanção formal contra os ministros, o que pode resultar em censura ética. Essa penalidade tem validade de três anos e pode afetar a reputação dos servidores do Executivo.
Vale lembrar que a CVM já alertou a Tupy, em outubro do ano passado, sobre a Lei de Conflito de Interesses, que exige autorização da CEP para que servidores federais exercitem atividades privadas. A recomendação foi de que a empresa exigisse a comprovação formal dessa autorização antes de nomear agentes públicos para cargos executivos.
Embora a Tupy seja uma empresa privada, a influência do governo Lula em suas decisões é significativa, devido à participação estatal da BNDESPar e dos fundos de pensão Previ (Banco do Brasil) e Petros (Petrobras). A prática de nomear ministros para cargos em empresas estatais permite que eles recebam um complemento salarial, elevando suas remunerações a patamares próximos aos do setor privado, mesmo sem experiência específica nas atividades da companhia.
Por exemplo, Anielle Franco é graduada em letras e jornalismo, com mestrado em relações étnico-raciais. Antes de ingressar no governo, trabalhou como professora de inglês e atuou na direção do Instituto Marielle Franco, uma organização focada em direitos humanos. Sua formação e experiência não estão relacionadas à produção de componentes estruturais em ferro fundido, que é a principal atividade da Tupy.
Em 2024, os membros do Conselho de Administração da Tupy receberam, em média, R$ 39 mil mensais, somando R$ 4,28 milhões no ano. Além disso, foram pagos R$ 1,77 milhão para participação em comitês internos.
Os ministros Carlos Lupi, Anielle Franco e Vinicius Marques de Carvalho ocupam posições em diferentes comitês da Tupy. Carlos Lupi coordena o Comitê de Estratégia, Inovação e Sustentabilidade; Anielle Franco faz parte do Comitê de Pessoas, Cultura e Governança; e Vinicius Marques de Carvalho atua no Comitê de Auditoria e Riscos Estatutário. Ao somar os salários do governo e os recebimentos pela Tupy, os ministros têm rendimentos mensais que ultrapassam R$ 83 mil, quase o dobro do teto permitido para o funcionalismo público federal, que é de R$ 46 mil.
Recentemente, em outubro de 2023, Flávio Rezende Dematté, chefe de gabinete de Vinicius Marques de Carvalho, questionou a CEP sobre a necessidade de consulta formal, após reclamações da CVM. Um mês depois, a secretária-executiva da CEP, Renata Almeida D’ávila, confirmou que toda autoridade precisa de autorização prévia para exercer atividades particulares.
A CEP também destacou cinco casos em que ministros e executivos de estatais solicitaram autorização para participar de conselhos de empresas privadas, ilustrando a necessidade dessa consulta formal.