A Lei Complementar nº 214/2025 trouxe mudanças importantes no sistema tributário brasileiro. A mudança mais relevante foi a criação do Imposto sobre Bens e Serviços (IBS) e da Contribuição Social sobre Bens e Serviços (CBS). Essas novas normas definem o que são partes relacionadas, com regras mais claras sobre como identificar as relações econômicas entre pessoas e empresas que atuam no Brasil.
Já existe um conceito de partes relacionadas na legislação brasileira, especialmente em operações internacionais, através da Lei nº 14.596/2023, que fala sobre preços de transferência. Assim, a nova lei pode ser vista como um avanço ou como um desafio que pode gerar algumas confusões.
É importante que a gente analise as semelhanças e diferenças entre o conceito de partes relacionadas que já existe e as novas definições que a LC nº 214/2025 trouxe. Também é fundamental discutir as consequências para as empresas e os desafios jurídicos que vão surgir.
Conceitos Básicos e Semelhanças
A definição de partes relacionadas na LC nº 214/2025 segue grande parte do que já estava estabelecido nas leis anteriores e nas diretrizes de organismos internacionais como a OCDE. O foco dessa regulamentação é a influência substancial, que é a capacidade de uma empresa ou pessoa afetar as decisões financeiras de outra.
Entre as semelhanças, temos:
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Critério de Influência: O artigo 5º da nova lei define influência de forma ampla, parecida com a Lei nº 14.596/2023, incluindo relações empresariais, sociais e até pessoais que são importantes para os impostos.
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Abrangência das Relações: A LC nº 214/2025 fala de relações de controle, coligação, participação em lucros, além de laços familiares ou administrativos. Isso amplia os tipos de influências econômicas que devem ser consideradas.
- Alinhamento com Normas Internacionais: A nova lei adota o princípio "arm’s length", que é uma regra da OCDE, exigindo que as transações entre partes relacionadas sejam avaliadas de acordo com os preços de mercado, evitando distorções fiscais.
Diferenças e Contradições com Normas Anteriores
Apesar das semelhanças, a LC nº 214/2025 trouxe novas regras que podem causar confusões e desafios na prática. Aqui estão algumas das principais diferenças:
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Maior Abrangência: A nova legislação parece aumentar o número de operações que se encaixam no conceito de partes relacionadas. Ao contrário da Lei nº 14.596/2023, que se limita a operações internacionais, a LC nº 214/2025 cobre operações internas que antes não eram consideradas. Agora, o IBS e a CBS serão aplicados sobre o valor de mercado dessas transações, independentemente do valor real praticado.
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Critérios Objetivos vs. Abordagem Qualitativa: Enquanto a nova lei estabelece percentuais fixos (por exemplo, 25% dos lucros ou 20% do capital social) para definir relações de influência, a Lei nº 14.596/2023 usa uma abordagem mais flexível, avaliando caso a caso.
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Tributação de Operações Não Onerosas: A LC nº 214/2025 permite impostos sobre operações que não envolvem pagamento direto, como brindes, doações entre empresas do mesmo grupo e distribuição de lucros em forma de bens. Isso já era discutido antes, mas a nova lei traz uma aplicação mais clara, o que pode gerar disputas legais.
- Insegurança Jurídica: O parágrafo 7 do artigo 5º permite que a regulamentação mude os critérios para definir o valor de mercado nas transações. Isso deixa espaço para interpretações variadas, podendo levar a inseguranças e litígios.
Impactos Práticos para as Empresas
As mudanças na LC nº 214/2025 apresentam desafios diretos para empresas que atuam com grupos econômicos locais e realizam transações no Brasil. Os principais impactos incluem:
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Aumento na Complexidade do Compliance Tributário: As empresas vão precisar rever suas estruturas e formas de precificação para seguir as novas regras.
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Risco Alto de Autuações Fiscais: A ampliação do conceito de partes relacionadas e a possibilidade de tributar operações não onerosas podem gerar disputas tanto administrativas quanto judiciais.
- Insegurança entre IBS/CBS e Outros Impostos: As diferenças entre as normas podem resultar em abordagens tributárias distintas, o que exigirá um planejamento fiscal mais cuidadoso.
Questões de Constitucionalidade
A LC nº 214/2025 pode criar debates sobre sua conformidade com princípios constitucionais e legais. Isso inclui o princípio da capacidade contributiva, vedação ao confisco, liberdade econômica e autonomia privada. Dependendo da aplicação, esses pontos poderão ser questionados na Justiça, especialmente sobre a tributação de transações sem pagamento e a reavaliação de valores pelo Fisco.
A nova legislação representa um passo importante para definir as partes relacionadas no Brasil. Embora esteja alinhada com diretrizes internacionais e promova transparência, sua implementação pode causar insegurança e disputas.
Por um lado, a norma esclarece critérios e amplia a tributação; por outro, cria conceitos que podem entrar em conflito com regras já estabelecidas. O grande desafio será garantir que a aplicação da lei respeite os direitos constitucionais e não prejudique as empresas.
Diante desse cenário, é crucial que as empresas analisem suas relações sociais e comerciais com atenção, para evitar problemas fiscais e se ajustar às novas leis. O tempo mostrará se as alterações da LC nº 214/2025 vão melhorar o sistema tributário brasileiro ou se darão início a novas questões legais.